sexta-feira, junho 18, 2004

[Sem título]
A ideia, sabe-se lá com que fim, é clara. Fazer confundir o Presidente norte-americano George W. Bush, e as suas acções políticas e militares, com a totalidade dos evangélicos. Os autores dos textos são católicos com aparentes "protestantivites" mal curadas, como Frei Bento Domingues e Sarsfield Cabral, e agnósticos empedernidos, como Mário Soares. Os artigos vão saindo com regularidade nos jornais desde há uns meses para cá.
Obviamente que esta tentativa de generalização é um disparate. Tanto o denominado "sionismo cristão" como a intervenção militar no Iraque, as duas acusações maiores, têm entre os evangélicos apoiantes e detractores. Aliás, a reacção à guerra que depôs Saddam está longe de se poder fundamentar num único ponto de vista. O cristão, pela sua nova natureza, ama e trabalha para a paz. Mas isto não significa que seja necessariamente pacifista. Pacifismo implica a ausência do uso da violência em qualquer circunstância. E se há cristãos que vivem coerentemente, e muitas vezes com um preço elevado, este ideal, como os Menonitas, também é verdade que para a maioria a conquista da paz e da justiça justifica, em situações extremas, o recurso às armas. A Segunda Guerra Mundial constitui aqui um caso paradigmático. Nesta perspectiva, a invasão do Iraque pode ser valorizada de forma diferente por dois evangélicos sem que haja entre eles um conflito doutrinário. Os meios para alcançar o objectivo podem variar. O objectivo em si, neste caso a paz, esse sim, importa ser comum.
Mas, mais do que o conteúdo erróneo dos artigos, que num meio tão ignorante da diversidade religiosa como o nosso, nem choca muito, incomoda-me a reacção que um número crescente de evangélicos vem tendo em relação à referida "campanha".
Concerteza que é muito mais agradável sermos associados a um Prémio Nobel da Paz, como Jimmy Carter ou Martin Luther King, do que a um impopularíssimo e insultado George Bush. No entanto, alguns evangélicos parecem ter esquecido que não é o reconhecimento público ou o barómetro da opinião pública que definem um cristão. Bush pode ser uma companhia incómoda para uma minoria religiosa em Portugal. Mas não é por isso que podemos por em causa a sua fé ou renegá-lo como irmão em Cristo. As suas convicções religiosas são, tanto quanto se conhece, claramente evangélicas. Terá opções doutrinárias que me causam perplexidade. Mas o mesmo acontece entre um baptista e um carismático, e isso não constitui motivo para se renegarem mutuamente.
Tal como as opções politicas do Presidente norte-americano devem ser avaliadas à luz do Evangelho, também é sob essa mesma luz que se reconhecem os que partilham connosco a fé em Jesus Cristo. A bitola da popularidade e a escala benefício/prejuízo não ficam nada bem nas mãos evangélicos.
Pedro Leal